terça-feira, 6 de dezembro de 2011

As escolhas dos deputados

Policiais fazem cordão para isolar a Assembleia do povo. 
Mais uma vez, na calada da noite, a população paranaense assistiu a aprovação de projeto de lei apesar dos reclames populares. Quem está acompanhando os jornais, observou que manifestantes ocuparam a Câmara dos Deputados de Curitiba ontem, como forma de protesto contra o PL 915/2011. Este projeto, de iniciativa do Executivo (nomeando os bois, Beto Richa), tem por objetivo qualificar as denominadas Organizações Sociais (OS’s). Elas consistem em pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde. Na prática, com a aprovação desta lei, o governo poderá delegar às OSs serviços de responsabilidade do setor público, como saúde e cultura.
Na verdade, trata-se de um fenômeno oriundo dos processos de privatização do setor público promovidos na presidência de Fernando Henrique Cardoso. As OSs estão previstas na Lei nº 9.637, de 15 de maio de 1998.
Já que o PL 915/2011 versa sobre OSs na saúde, devemos observar que o art. 23, inciso II, da Constituição Federal dispõe que “Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: II - cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência;”.
Além disso, saúde pública é uma responsabilidade do Estado e direito assegurado a todos os cidadãos por meio do art. 6º, também da Constituição Brasileira, que a prevê como um direito social (Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição).
Ideologias a parte, o que se deve ter em mente, sempre, é a melhoria da prestação deste serviço à população. È notório o problema da saúde pública não apenas no Paraná, mas por todo o país. Entretanto, o que devemos pensar é se realmente a solução ideal para este problema encontra-se na “privatização” da prestação de serviço e, sobretudo, a maneira pela qual está “solução” esta sendo implementada pela nossa Câmara Legislativa.
Primeiramente, será que o simples fato de repassar a responsabilidade – hoje nas mãos do Estado – à organizações privadas melhorará a qualidade do sérico público? Livrando-se da burocracia estatal, à princípio, se obteria uma saúde pública mais eficiente, com possibilidade de contratação de médicos, enfermeiros auxiliares, entre outros sem os entraves característicos dos cargos públicos. Entretanto, teríamos uma verdadeira “gestão privada do erário”. Ora, os dirigentes das OSs seriam escolhidos de forma privada, bem como poderiam livremente colocar qualquer pessoa para ocupar os cargos da OS. Claro que a lei delimitará esta gestão, bem como a Lei nº 9.637/98 já faz. Mas por ser um setor “terceirizado”, fora do serviço público, será que a fiscalização do poder público se tornaria mais difícil.
Além disso, não estarão sujeitos aos processos licitatórios. Se mesmo com o crivo das regras licitatórias enfrentamos diversos problemas e observamos vários casos de corrupção, será que a livre disposição de verbas públicas (por exemplo, destinadas à saúde, como será possibilitado com a aprovação do PL) nas mãos de dirigentes privados (pois não estão diretamente ligados ao estado, não são funcionários públicos), para gastarem da maneira que melhor entenderem, com uma fiscalização certamente mais tênue do Estado, não levará a criação de um sistema ainda mais fraudado (e com a mesma ou pior eficiência)?
Em segundo lugar, é questionável a maneira pela qual se está tentando aprovar este Projeto de Lei. O fato da TV Sinal, que transmite as seções legislativas da Câmara, ter simplesmente cortado a transmissão quando os manifestantes ocuparam o plenário, já nos diz alguma coisa. Por que não mostrar, afinal? Mas o que mais marcadamente se verificou foi o fato de se ter tentado uma rápida aprovação do PL, e sem qualquer consulta popular. O próprio presidente do Tribunal de Contas do Paraná, Fernando Guimarães, em entrevista à Gazeta doPovo, pronunciou-se sobre a não realização de audiências públicas para se discutir o teor do Projeto. “O projeto e as propostas de gestão nele inseridas mereceriam uma audiência pública, organizada e disciplinada em ambiente democrático e civilizado”.
Hoje, mais uma votação será realizada na ALEP na Capital. O desembargador aposentado e professor da UFMG, Márcio Túlio Vianna, declarou na audiência pública sobre a Terceirização empreendida pelo TST, que “nas ciências exatas fazemos, sobretudo, descobertas. Nas ciências jurídicas fazemos, sobretudo, escolhas”. Claro que todos queremos e “escolhemos” para nosso Estado uma saúde pública e gratuita de qualidade, afinal, é um direito social de todo cidadão. Mas será que a escolha que nossos “representantes” estão também “escolhendo” esse tipo de saúde pública?
Quem quiser saber um pouco mais sobre o assunto, saiu hoje no Paraná TV: http://g1.globo.com/videos/parana/t/paranatv-1-edicao/v/deputados-votam-hoje-projeto-sobre-os/1721288/

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